O brilhante texto abaixo, esclarece com máxima lucidez, a esdrúxula indicação do Dr. Toffoli (Pres. AGU) a vaga de Minsitro do STF.
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Uma rejeição republicana
João Ricardo dos Santos Costa*
"Republicana e democrática, nem por isso a Constituição de 1988 deixou de exibir dispositivos de natureza autoritária. Um deles é o que concentra na vontade do Presidente da República a indicação e nomeação dos membros do Supremo Tribunal Federal: a Suprema Corte, com poderes, potencializados pela súmula vinculante, de impor sua jurisprudência aos 16 mil magistrados concursados do país, é constituída por onze ministros nomeados por uma única pessoa.
A inegável honestidade e conhecimento jurídico de tantos ministros que passaram pelo STF não escondem o fato de que lá chegaram porque em algum momento isso representou a vontade singular de um Presidente da República . Claro, a nomeação passa pela prévia aprovação do Senado, mas não há precedente histórico de rejeição do nome indicado pelo Presidente.
Com tal facilidade, nenhum presidente da era democrática perdeu a oportunidade de, ao menos uma vez, indicar membro do seu governo, seja Ministro da Justiça, Advogado Geral ou outro auxiliar. Sarney, Collor, Itamar e FHC fizeram isso, e não se poderia esperar outra coisa de Lula. Até demorou, se considerarmos que está no sétimo ano de governo e na sua oitava indicação, mas isso não torna menos frágil a norma constitucional e nem menos criticável a indicação do Advogado Geral da União, José Antônio Dias Toffoli.
Há, é certo, uma ressalva à discricionariedade do presidente: o indicado deve ter conduta ilibada e notório saber jurídico. Mas, a quem compete decidir acerca da conduta e do saber dos futuros ministros? Quantas pessoas em nosso país atendem a esses requisitos? Que critério se há de usar para dizer que determinada pessoa exibe essas condições?
Do atual indicado já se ouviram vários questionamentos acerca da profundidade do saber jurídico - e, se dúvidas há, ele não é notório - assim como da conduta ilibada.
Parece que, nesse ponto, a dicção constitucional foi propositalmente genérica, para assegurar ao governante a imposição de sua vontade imperial, apenas em tese submetida a um Senado que de regra apresenta maiorias governistas, incapazes de questionar o prato que lhe vem pronto.
Não se trata de julgar o conhecimento jurídico ou a probidade de Toffoli, mas de, em julgamento político das condições de preenchimento do cargo, dizer que a sociedade brasileira não está convicta desse conhecimento jurídico e probidade. Cabe assinalar que, ao contrário do princípio geral de presunção de inocência, aplicável ao cidadão comum, uma condenação judicial, mesmo provisória, impõe cautela maior que a habitual quando se trata de uma nomeação política para o STF.
Quando, então, o indicado é do partido do Presidente e integra o seu governo, desnuda-se a natureza não republicana do ato.
A comunidade jurídica e os cidadãos brasileiros não podem aceitar que a composição da mais alta Corte do país continue a depender da vontade exclusiva do Presidente da República. Não podem aceitar que sejam nomeados membros do Executivo, sem que ao menos sejam submetidos a um período mínimo de carência. Não podem aceitar que o Senado da República seja submisso a essa prática.
Cabe ao Senado rejeitar a indicação, para que seja nomeado ministro pessoa não integrante de governo e cuja conduta e conhecimento jurídico consigam a aprovação geral que o atual indicado não obteve; cabe à sociedade se mobilizar pela alteração dos critérios de indicação dos ministros."
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* Juiz de Direito em Porto Alegre.
Fonte: http://magrs.net/?p=8201